A Importância do Pré-questionamento no Processo Civil

  No âmbito do processo civil, para que haja apreciação de Recurso Especial e Extraordinário, é indispensável o prequestionamento da questão federal ou constitucional suscitada pela parte. Isso significa dizer que o acórdão recorrido, proferido pelo Tribunal local precisa, obrigatoriamente, enfrentar, ainda que implicitamente, o dispositivo de lei federal tido por violado. O dispositivo não precisa estar obrigatoriamente citado na decisão, bastando que o aresto se posicione sobre as matérias ventiladas nos recursos endereçados ao Superior Tribunal de Justiça e/ou Supremo Tribunal Federal. É o que assinala, com propriedade, o Ministro Athos Gusmão Carneiro (Recurso Especial, Agravos e Agravo Interno, p. 31): “...para que determinada questão seja considerada como prequestionada, não basta que haja sido suscitada pela parte no curso do contraditório, preferentemente com expressa menção à norma de lei federal onde a mesma questão esteja regulamentada. É necessário, mais, que no aresto recorrido a matéria tenha sido decidida, e decidida manifestamente (não obstante se possa considerar prescindível a expressa menção ao artigo de lei)”. Enfim, o prequestionamento consiste num importantíssimo requisito de admissibilidade dos apelos excepcionais para Brasília.

  No mais das vezes, os advogados passam por um dilema nas vésperas da interposição dos Recursos Especial e Extraordinário, por conta do prequestionamento. É que, de um lado, o STJ e o STF exigem que as matérias ventiladas nos recursos já tenham sido decididas nos autos. Do outro, os Tribunais entendem - com chancela dos Tribunais Superiores - que não estão obrigados a decidirem sobre todas as questões suscitadas pela parte. Há casos absurdos de aplicação de multa à parte que opõe embargos de declaração com manifesto propósito de prequestionamento, em que pese a existência da Súmula 98 do STJ, que afirma a inocorrência de intuito protelatório nessas situações. O contra-senso é alarmante. E não são raras as situações em que o advogado, angustiado diante da possibilidade de inadmissão de seu recurso, é forçado a opor segundos embargos declaratórios, suplicando ao Tribunal que, apenas, se manifeste expressamente sobre a questão, para cumprimento do requisito do prequestionamento. É um tormento que poderia ser evitado.

  Nos últimos anos, o processo civil brasileiro tem passado por inúmeras reformas, cujo objetivo não é outro senão tornar a sistemática mais dinâmica e racional, eliminando tecnicismos inúteis, que tornam o processo ininteligível para a maioria da sociedade. Tem sido incessante a busca pela efetividade perdida. É notável o esforço envidado pelo para reduzir o número de recursos nos Tribunais Superiores, com destaque para as novas leis que criaram, em nosso sistema, a Repercussão Geral e a Súmula Vinculante. No entanto, tenhamos cautela. Sim, é importante combater a lentidão dos processos, reduzindo o quanto possível, o processamento de recursos descabidos. Mas esse argumento deve ser utilizado com moderação, para que não sejam banalizadas regras procedimentais consagradas no processo civil. Ora, se é obrigação da parte, por exemplo, prequestionar a questão federal a ser, em seguida, suscitada no Recurso Especial, é dever do Tribunal local, por outro lado, proferir um acórdão que enfrente aquela questão, mesmo que seja para rejeitá-la.

  É de se lamentar que, no foro, tenha sido cada vez mais comum um posicionamento dos julgadores no sentido de que o acórdão não precisa enfrentar todas as questões argüidas na ação, desde que uma seja suficiente para o julgamento. Tal entendimento, além de processualmente incorreto, é extremamente lesivo para o direito da parte, pois, se o Tribunal local considera que apenas um aspecto da demanda basta para decidi-la, omitindo-se com em relação aos demais, tal resolução tolhe o direito da parte de levar à instância superior o conhecimento da causa como um todo, pois o que lá chegará é apenas a visão reducionista que foi dada à lide pelo Tribunal local. E isso é inaceitável.

  Segundo julgado emanado do Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal “não está obrigado a julgar apenas, mas a emitir juízo de valor para afastar os artigos de lei indicados pela parte e que embasam as teses jurídicas discutidas”. Não pode o magistrado, na atividade judicante, silenciar sobre determinado ponto reclamado na lide, deixando argumentos sem resposta. Mesmo que seja para rejeitar, compete a ele enfrentar todas as alegações declinadas pelos litigantes, em homenagem ao princípio do devido processo legal e da ampla defesa.

  Consistindo o prequestionamento num requisito indispensável para viabilizar o acesso do processo às instâncias especiais, urge que os magistrados, coibindo os abusos, compreendam a dificuldade enfrentada pelos advogados acerca do prequestionamento, e emitam juízo de valor acerca de todos os argumentos suscitados na lide, tudo em prol da melhoria da prestação jurisdicional.


Texto confeccionado por
(1) Luciano Saboia Rinaldi de Carvalho

Atuações e qualificações
(1) Advogado - autor de diversos artigos jurídicos publicados no âmbito do Direito Civil, Direito Processual Civil, Direito Comercial, Falências, Legislação de trânsito e Arbitragem.
 

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